Um conjunto habitacional do programa Minha Casa, Minha Vida no município de Surubim se tornou um pesadelo para muitas famílias. Desde dezembro de 2024, os moradores dos residenciais José Gercino Cabral (bloco amarelo) e José Pedro de França Lima (bloco azul) convivem com rachaduras profundas, infiltrações e o medo constante de desabamento. O que começou como pequenas fissuras após as primeiras chuvas da estação se transformou em um problema estrutural grave, expondo falhas que podem comprometer a segurança dos edifícios.
Em entrevista ao Portal da Cidade Surubim, o síndico do bloco azul, Edjalma Hermínio, e a subsíndica do bloco amarelo, Haislan Maria, relataram a saga de descaso enfrentada pelos moradores do habitacional. "Quando as primeiras rachaduras apareceram, procuramos a Caixa Econômica, que nos mandou falar com a seguradora, que nos pediu documentos, mas nada foi resolvido", conta Haislan.
A Defesa Civil municipal foi acionada, mas sua ação se limitou a uma vistoria superficial. "A Prefeitura alegou não ter engenheiro estrutural disponível. Sem saída, organizamos uma vaquinha entre os moradores para contratar um profissional particular", relata Edjalma.
Só que a dificuldade foi grande para conseguir o valor que era necessário para o laudo de um engenheiro estrutural, que chegava aos R$ 9 mil reais. "Com a vaquinha virtual alcançamos apenas um pouco mais de R$ 1.500 reais. Então, fomos para a Câmara Municipal, onde alguns vereadores nos ajudaram. E também fomos à Prefeitura, onde o prefeito Cleber Chaparral complementou com o valor R$ 5 mil reais, chegando ao valor necessário", comenta Edjalma.
Pontos elencados no laudo
A vistoria realizada pelo especialista Jandi Santos identificou fissuras, rachaduras e infiltrações mais graves nos blocos D (azul) e C (amarelo), causadas por recalque diferencial. Entre os problemas constatados, destacam-se fissuras em esquadrias e paredes, descolamento da alvenaria, falhas de impermeabilização em banheiros e fachadas, além da ruptura do piso do passeio externo, sem impacto estrutural nos blocos.
O laudo, assinado pelo engenheiro civil Eduardo Augusto de Oliveira Martins, recomenda o monitoramento contínuo dos deslocamentos e a adoção de ações corretivas conforme a gravidade. Se estabilizados, os danos devem ser tratados pontualmente, reforçando peças estruturais. Caso persistam, será necessário um projeto de reforço estrutural. Também sugere-se um plano de manutenção preventiva para os sistemas estruturais, de vedação, cobertura, hidrossanitários e elétricos, conforme a norma NBR-5674.
O laudo destacou ainda a necessidade de medidas imediatas, como investigação geotécnica e estrutural, remoção de reservatórios de água individuais, reparos em vazamentos hidrossanitários, manutenção das caixas de inspeção e avaliação emergencial da Defesa Civil para mitigar riscos à segurança dos moradores.
O resultado da perícia, porém, frustrou os moradores. "O engenheiro chegou sem identificação adequada, sem equipamentos profissionais, e fez a vistoria basicamente com um celular", desabafa Haislan. O laudo final foi considerado vago, sem indicar claramente se havia necessidade de interdição ou quais medidas deveriam ser tomadas. "Ele simplesmente repassou a responsabilidade para a Defesa Civil", completa Edjalma.
Medidas jurídicas
O advogado Natuch Lira, que representa os moradores, busca alternativas para pressionar as autoridades. "Dois prédios estão em situação mais crítica, com danos estruturais que surgiram em dezembro. Como Surubim não possui Defesa Civil estruturada para análises técnicas, estaremos acionando a Defesa Civil estadual, que tem mais capacidade para avaliar a qualidade dos materiais utilizados na construção. Também vamos cobrar providências da Caixa Econômica e da construtora", explica.
"Além disso, vamos acionar o Ministério Público para garantir o direito dos moradores. Buscaremos auxílio-moradia para aqueles que não podem permanecer nos imóveis e indenizações caso os prédios não sejam recuperáveis. Como todos os edifícios apresentam rachaduras, pedimos acompanhamento técnico preventivo. A situação também afeta a saúde mental das famílias, e buscaremos apoio psicológico para os moradores. Seguiremos pressionando por soluções urgentes", conclui o advogado.
O Portal da Cidade Surubim procurou a Comissão Municipal da Defesa Civil em Surubim, que, em março, encaminhou um ofício à Caixa Econômica Federal solicitando providências para a resolução do problema. Segundo o coordenador da Comissão, Vinícius Coelho Farias, o setor de habitação da Caixa entrou em contato para entender a situação, que já estava detalhada no ofício e anexos enviados. No entanto, após essa consulta inicial, não houve retorno oficial, e o caso segue em análise pelos setores competentes da instituição.
Medo constante
Enquanto a burocracia se arrasta, os problemas estruturais só pioram. No bloco amarelo, a situação é mais crítica nos blocos A e C. "No C, dos 32 apartamentos, apenas cinco ainda estão ocupados", diz Haislan. No bloco azul, o D apresenta fissuras que vão do térreo aos andares superiores. "Algumas rachaduras já têm mais de dois metros de extensão", conta Edjalma.
A rotina no conjunto mudou drasticamente. "Não dormimos tranquilos, especialmente quando chove. Qualquer barulho nos assusta", conta Haislan. Enquanto isso, os moradores vivem na incerteza: não podem voltar para seus apartamentos inseguros, mas também não têm recursos para alugar outro lugar. Para o advogado Natuch Lira, a situação exige urgência. "Com a chegada do inverno e aumento das chuvas, a situação pode piorar rapidamente. Não podemos esperar uma tragédia acontecer", alerta.
Os moradores, por sua vez, só querem uma resposta concreta. "Queremos apenas o direito a uma moradia segura. Não pedimos favor, apenas o cumprimento do que foi prometido quando adquirimos esses apartamentos", resume Edjalma. Enquanto esperam por uma solução, as rachaduras continuam a crescer – assim como a angústia de quem não sabe onde vai morar amanhã.